31 de dezembro de 2014

A carta


Acorda, trabalha, se exaspera,
executa sua rotina nos mínimos detalhes
numa repetição enfadonha e desesperada
não se permitindo, nunca, uma hora a mais de sono,
um murmúrio, um mísero atraso.

Ama, sofre, sonha, espera,
como se valesse a pena todo e qualquer momento debaixo do sol,
ignorando que a cada passo que dá morre mais um pouco, se mata,
que cada pensamento seu é um adeus,
e que cada verso escrito, uma despedida, 
uma linha, um esboço
de uma carta suicida.

14 de dezembro de 2014

Vestígios

(A cama do defunto, de Edvard Munch)


















Não, não somos nada

e nunca seremos.

Não passamos de simples espectros do que foram os outros,
sombras dissipadas na parede.

Ontem, corremos em direção ao mar,
construímos castelos de areia,
conversamos com amigos imaginários.

Hoje, num leito branco e cheirando a éter,
abrigamos mais um tumor ancestral,
e esperamos pelo dia que sempre vem,
única verdade inabalável.

Amanhã, quem sabe,
nos tornemos vestígios,
lembranças escusas na mente de alguém.

9 de abril de 2014

Vencedor do 2º Prêmio Brasília de Literatura












Roberval Pereyr foi um dos ganhadores do 2º Prêmio Brasília de Literatura. O seu livro Mirantes ficou em 1º lugar na modalidade Poesia. Estou feliz demais, pois sou admiradora confessa da poesia de Roberval Pereyr e sinto-me honrada em tê-lo como meu orientador ─ no mestrado da UEFS ─ e meu amigo. Roberval, além de grande escritor, é um professor excelente, um orientador atento e um ser humano raro: simples, honesto, sempre pronto a ajudar e dono de uma simpatia sem igual. Esse prêmio é, portanto, um reconhecimento mais do que merecido. 

Abaixo, compartilho o seu poema "Desmentido", um dos meus preferidos: 

DESMENTIDO

Alguém me reconhece num retrato de menino.
Não sou eu: é minha antiga paz.
A história de um homem é sua pista falsa:
estudam meus sonhos, meus passos, meus mapas
e dizem quem sou inutilmente.
Inutilmente.
Porque sou sempre o que vem pelo atalho.

(Roberval Pereyr)