16 de outubro de 2013

Nunca mais















Olhos fixos no teto. Não queria tomar banho algum. Que o deixassem em paz. Era pedir muito? A sua mulher, desde que ele ficara doente, não era mais a mesma, havia perdido a alegria de outrora. Antes, sempre tão viva e atraente, andava agora triste, cansada, sem esperanças. Em alguns meses, envelhecera anos. Tinha se acostumado com a nova rotina, não reclamava, o que a feria era não ser reconhecida pelo marido. Sabia que não era culpa dele, ninguém escolhia ter Alzheimer. No entanto, doía o fato de ter sido esquecida pela pessoa que mais amava, mesmo involuntariamente. Mas essa era uma realidade que ela precisava enfrentar: o marido não voltaria a ser como antes. Nunca mais. O único momento em que ele se lembrava dela era ao contemplar as suas fotos de quando jovem. Olha que moça linda, cabelos loiros, sorriso encantador. A minha mulher. Eu era apaixonado por ela. Onde ela está? Você a viu? Sou eu, esta sou eu, depois que nos casamos. Não, não é você. Onde já se viu uma doidice dessas? Veja, que belos olhos azuis. Para onde será que ela foi? Dias depois, ao levar comida para o marido, percebeu que ele a observava de modo estranho, com a boca aberta, um ar de criança que está vendo o mar pela primeira vez. Depositou o prato em seu colo e subiu as escadas. Ao retornar, ele perguntou: você viu a moça bonita, loira, de olhos azuis? Tão linda, sorriso encantador... ela esteve aqui, veio me ver. Deixou este prato de comida, subiu as escadas e desapareceu. Estou até agora esperando, olhando lá pra cima, mas ela não voltou, nunca mais voltou.