17 de fevereiro de 2013

Bar















     
        Depois de dormir durante doze horas seguidas, ainda me sentia mal. Não nasci para viver só. Apanhei a minha carteira e saí, decidido a beber até esquecer que existia. Entrei no primeiro bar que encontrei, cheio e barulhento. Fiquei. Pedi a bebida mais forte. E quanto mais engolia aquele líquido amargo, mais pensava na morte. Nunca tive coragem, porém. Covarde e idiota. Sempre acreditando, esperando por algo que jamais viria. Do outro lado da rua, um bar vazio. Sequer um bêbado solitário como eu. O homem magro, que ficava no balcão, ia até a porta a cada minuto, estalava os dedos, olhava para os lados e voltava, resignado. Fiquei com pena. Sim, além de idiota, me comovo fácil. Paguei a conta, atravessei a rua, me sentei numa cadeira velha e ensebada e fiz o meu pedido ao magrelo. A bebida estava péssima. Eu me sentia traído. Tive compaixão daquela espelunca e estava sendo lesado. Deveria ter adivinhado, a julgar pelo abandono do local. Rosnei alguma coisa inaudível, fiz cara de poucos amigos, quis ir embora. Fiquei. Tomei outras doses e, uma hora depois, saí, resolvido a caminhar pelas ruas e becos da cidade que conhecia tão bem. Quando as pernas reclamaram, parei para descansar num banco, de onde podia contemplar a lua. Ao menos, era uma companhia. Contei a ela todas as minhas dores. Ela me ouvia, com a natural indiferença dos astros. Até que percebi um arrastar de passos. Não estava mais sozinho. Dois grandes vultos que pareciam estar armados andavam rapidamente em minha direção. Senti falta da solidão do bar. Pela primeira vez, temi pelo que poderia acontecer. Pensei na minha vida de merda. Fiquei.

7 de fevereiro de 2013

O peso do tempo

















        Talvez seja um pouco tarde para escrever sobre o assunto, mas apenas ontem, ao ler uma matéria sobre a morte de Walmor Chagas, fiquei inquieta. O ator, aos 82 anos, sofria de uma doença ocular que o impedia de ler (uma das coisas que mais gostava), ficando, para isso, dependente da filha. Começou, então, a achar que estava incomodando. "Num dia é o pára-choque, no outro é a rebimboca da parafuseta", brincava Walmor Chagas, com relação aos vários exames que se submetia nos últimos dias. Diabético, foi diagnosticado também com gastrite e esofagite. Ao conversar com o amigo Antônio Cardoso, o ator confessou que “queria morrer antes de usar fraldão”. Camus escreveu que “o suicídio é a grande questão filosófica de nosso tempo”. Sim, e é tão difícil, pelo menos para mim, compreender o que leva uma pessoa a tirar a própria vida, enquanto eu, vivo com medo da morte, por mais que a existência, na maioria das vezes, se mostre absurda e sem sentido. Quem sabe, com a chegada da velhice, eu possa entender um pouco melhor tudo isso. Parece claro que Walmor Chagas cometeu suicídio por imaginar ser um estorvo na vida da filha, da família, dos amigos. O psicanalista Freud, numa entrevista concedida ao jornalista americano George Sylvester Viereck, em 1926, disse algo que me tocou profundamente: “Talvez os deuses sejam gentis conosco, tornando a vida mais desagradável à medida que envelhecemos. Por fim, a morte nos parece menos intolerável do que o fardo que carregamos”. Ele devia ter razão. Só nos resta mesmo torcer para que, no fim da nossa trajetória, possamos aguentar firmes o peso do tempo.