26 de junho de 2011

Mauro Piva, sem título, massa modelar, 2000.



















NADA

Toc! Toc! Não tem nada aqui, só uma pedra a rasgar-me por dentro. O rio que habita em mim já não derrama letra alguma. O olho secou, o lábio secou, a vida secou. O cheiro de mofo a impregnar-me as narinas, o sentimento de morte a avassalar o meu peito. Toc! Toc! O outro insiste. Tudo é secura, eu já disse. Secura sem verbo, secura da carne, secura. Só o formol a preservar o meu corpo, sem rosto, sem vida, sem nada. Tic-tac. Passa o tempo, nada a passar, só há falta. A falta a caminhar com o tempo; o tempo a apontar para morte. A vida é pétrea, disse o poeta. Nada me resta, nada é o que resta, só o fim permanece: penso comigo. A palavra exilou-se de mim, levando consigo a alegria, a tristeza. Ficou esta pedra a cavar-me um vale profundo, sem cor, sem dor, sem beleza, do tamanho da tampa que cobre o universo.  

Adriano Alves

12 de junho de 2011

A ponte, de Claude Monet


















TRAVESSIA
Para Adriano Alves

O que há entre a vida e a morte? Uma curta ponte.
                                             Machado de Assis

O tempo corre
sem pressa
e a caminhada
me cansa,
sinto uma eterna ânsia
em chegar.

Olho para a frente
e quero ver
além da estrada,
além do que posso
imaginar.

Os anos passam,
tudo é sem graça:
o amanhã parece igual
ao que é hoje
ao que foi ontem.

Mas,
se sigo ao teu lado,
tudo é mais fácil:
porque ganho asas
para atravessar
a ponte.

1 de junho de 2011














FRONTEIRA


Abro os meus olhos
e estou entre o nada
e o abismo,
naquele não-lugar,
o lugar nenhum. 

Estou aqui,
exatamente aqui 
e não faço idéia
de como sair.